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domingo, 2 de abril de 2017

A ROSA E O ESPINHO




Ele queria dela a juventude, a carne tenra, a amplitude dos seios no vestido que mal escondia o que deveria ser segredo.
A ele atraia o medo de menina no olho profundo que o seguia a descobrir o mundo.
Ela queria dele o compromisso, o amor eterno dos livros que andara lendo escondido por proibidos, queria atravessar se preciso um oceano e por ele mudar os planos de vida.
A ela atraia a ideia do pra sempre, as mãos entrelaçadas em promessas, os folguedos, as vindouras festas que antevia.
Ele só queria que ao final do dia ela deitasse no seu leito, se esparramasse inteira no duro do seu peito e deixasse a descoberto seu ventre enquanto o sangue ainda corria quente em suas veias.
Ela só queria um jeito de se aninhar e nunca mais ter solidão, acalmar de vez um coração que nunca sentira algo tão fundo e dolorido.
Enquanto pra ele bastava conquistar o direito de lhe arrancar o vestido, lhe colocar em pelo, carnes nuas, fazê-la sua e sair de cena; ela ousava sonhar com a perpetuação da pena, com a escravidão bem-vinda, com o suplício que viria com o vício que ele era.
Ele nunca entendeu o desespero com que ela se agarrou aos seus cabelos, os gritos roucos, o pranto, o riso louco, a tentativa de barrar seus passos já na saída.
Ela nunca entendeu porque, ou o que fez pra que tudo se acabasse sem adeus, talvez uma palavra não dita, a falta de um poema, uma pequena frase esquecida murmurada num esgar de dor e de prazer.
Abaixou a crista para a vida, se conformou lambendo a ferida que ele deixou.
Enlouqueceu talvez, quem vai saber?
Só se sabe que agora nada mais resta da beleza, da euforia, dos sonhos dos antigos dias.
Ficou apenas uma janela aberta, uma sombra que se projeta dela, uma cortina que voa sem destino, e um menino crescendo sorrateiro dentro do ventre que se deu inteiro,
pra quem nem merecia a honraria.
[elza fraga]
Escrito em 04/03/2017, e postado na mesma data no facebook


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