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domingo, 2 de abril de 2017

ATRAVESSANDO O PORTAL

Perdeu a cor, o brilho, a esperança/ desovou na primeira curva a criança/ que insistia em estar ali, dentro de si/e que nem sempre havia sido mansa/ sempre fora tempestade e rebeldia/ tinha a estranha mania de chegar primeiro/ e colocar no avesso seu roteiro.
Sem remorso, culpa ou medo/ a depositou na sarjeta/ nem sequer pensou se era acerto ou erro.
E vazia então seguiu só/ anciã buscando o amanhã da sorte/ procurando no caminho a estrela da morte/ e da travessia/ aquela guia que tudo sabia da estrada/ que entendia que no final da trilha/ toda protagonista, envelhecendo ou não/ por melhor que seja sua história/ um dia morre.
Mas ela ainda queria ver no céu/ uma estrela da manhã nascente/ e só partir quando o sol viesse de mansinho/ e num afago reverente/ lhe beijasse as faces/ lhe fechasse os olhos tão cansados/ e lhe soprasse aos ouvidos/ como um terno amigo/
"-Vai, agora é sua vez de descansar do mundo/ que esse lhe feriu profundo/ e sempre lhe virou as costas, deixou suas perguntas sem respostas/ sua juventude nua jogada por antigas ruas/ seu canto perdido sem ouvinte atento/ sem ecoar forte e sem mudar o rumo/ de algum passante que se aventurasse/ a caminhar junto a seus passos/ e que abraçasse a sua solidão/ levando pelas mãos sua alma inquieta/ e lhe criasse leito e laços."
E então obedeceu e foi cumprir sua meta/
Quieta saiu da viela por onde insistia em sua rota/ fechou nas mãos o pouco que era seu/ uma nesga do céu/ uma nuvem pra servir de coberta/ uma flor já morta/ um pouco do mar/ que esse sempre morou no seu olhar/ um pedaço de luz pra lhe servir de norte/ e corajosamente atravessou a morte!
[elza fraga]

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